1. O que a CEiiA pode contribuir para o projeto MOBAE, especificamente nos campos automotivo e aeroespacial?

O CEiiA, enquanto centro de engenharia e desenvolvimento, pode contribuir com a sua capacidade para interpretar tendências, identificar novas oportunidades e a sua experiência no desenvolvimento de novos produtos e serviços na área do automóvel e da aeroespacial, desde a fase de conceito, passando pela produtização e industrialização, até à fase de teste, validação e certificação.

 

  1. Com o aumento da expectativa de vida, estamos enfrentando o fenômeno da hiper-longevidade, que afeta as viagens dos usuários, com novas necessidades de mobilidade que precisam ser atendidas. Quais as principais contribuições do CEiiA para o projeto poderiam ser, na sua opinião, neste sentido?

A hiperlongividade é uma das grandes tendências da sociedade que com certeza irá afetar a forma como se pensam e desenvolvem os novos produtos e serviços na área do automóvel e da mobilidade do futuro, tendo em vista soluções adequadas para segmentos da população como os idosos e outros cidadãos com necessidades especiais. Nesta área, o CEiiA poderá contribuir com novas formas de pensar e desenvolver novas configurações de veículos e serviços inovadores que promovam a acessibilidade, recorrendo a tecnologias de conetividade e automação para a mobilidade, em segurança e conforto, de utilizadores com mobilidade reduzida.

 

  1. Você poderia nos falar sobre algumas das pesquisas ou projetos inovadores em que você está trabalhando atualmente no CEiiA?

Todos os projetos que desenvolvemos no CEiiA são inovadores, alguns dos quais pelas suas caraterísticas podem ter mais intensidade tecnológica do que outros. A inovação não tem a ver apenas com a tecnologia por si só, mas sim com a forma como a aplicamos e a usamos no desenvolvimento de um novo produto ou serviço.

Sendo o maior desafio da mobilidade a descarbonização, podemos destacar na área da mobilidade a plataforma de sustentabilidade AYR como o projeto mais disruptivo, por ser a primeira plataforma de quantificação, valorização e transação de emissões de carbono evitadas em ecossistemas de mobilidade, que recompensa comportamentos sustentáveis, podendo ser aplicada em cidades de todo o mundo. Ainda nesta área, o Programa BE, um novo conceito de veículo desenhado para uma nova lógica de serviços baseados em modelos de negócio inovadores que cruzam a partilha da posse com a partilha do uso (em que os utilizadores podem ser também investidores) e que explora a integração de redes de objetos e redes sociais. Na aeronáutica, destaque para a nossa participação no desenvolvimento da nova geração do tilt-rotor AW609 da Leonardo helicopters.

 

  1. Como será o carro inteligente do futuro, quais serão os principais desafios e avanços da indústria automobilística e aeroespacial portuguesa neste sentido?

O carro do futuro será um dispositivo de mobilidade zero emissões, autónomo e de uso partilhado, que evoluirá para a capacidade para voar, cruzando tendências do automóvel e da aeronáutica. De facto, acreditamos que a integração entre a mobilidade horizontal e a mobilidade vertical será com certeza um novo driver da mobilidade nas cidades e, como tal, é fundamental que, quando se pensa o desenvolvimento de produtos e serviços para o futuro, os mesmos devam estar alinhados com estas tendências.

Atualmente, o CEiiA está envolvido em vários projetos de UAM – Urban Air Mobiility, onde destacamos o referido programa BE, que conta com um roadmap de desenvolvimento que contempla a integração entre mobilidade horizontal e vertical para, por exemplo, serviços de entregas de mercadorias ou resposta a emergências em contexto urbano.

 

  1. Você considera que o setor responde às exigências da sociedade portuguesa, e quais são as tendências que você observa a este respeito, em termos de mobilidade?

O setor automóvel é um dos mais inovadores em Portugal, e incorpora cada vez mais inovações que permitem dar resposta aos desafios da sustentabilidade e às metas ambiciosas das cidades e dos países. Os construtores, e consequentemente toda a cadeia de valor que envolve os seus fornecedores e as entidades de investigação e inovação, estão por isso a trabalhar na incorporação de inovações para uma mobilidade cada vez mais conectada, integrada e sustentável e na direção do carro como um dipositivo de mobilidade desenhado para ser um integrador de serviços (Device as a Service).

No geral, e em Portugal não é diferente, na liderança desta transformação estão as novas gerações de utilizadores, que nasceram na época do digital e para quem o físico perdeu significado, abdicando da posse do transporte individual pelo acesso a um sistema de mobilidade urbana que responda, em cada momento, às suas necessidades através de uma aplicação no telemóvel.

 

 

  1. Você acha que o intercâmbio de conhecimentos de ambos os lados do Minho pode ser frutífero para o avanço e melhoria da competitividade na Euroregião Galiza-Norte de Portugal?

Acreditamos que sim, e que estes sectores podem ser centrais nessa melhoria de competitividade. A região Galiza-Norte de Portugal tem já um histórico de colaboração que se iniciou com a criação de uma plataforma tecnológica que envolveu, entre outros, o CEiiA e o CTAG, e que criou uma base de competências no desenvolvimento de produto e testes no setor automóvel. Esta colaboração evoluiu na área da mobilidade elétrica, onde se destaca o primeiro corredor transfronteiriço a partir da rede MOBI.E em Portugal e, mais recentemente, na área dos veículos autónomos e conectados.

Para além disso, as cadeias de valor do automóvel cruzam-se entre os dois lados da fronteira, com a PSA de Vigo como um dos principais clientes da indústria automóvel em Portugal e em torno da qual se desenvolvem várias colaborações entre os dois países nos novos modelos de veículos daquele construtor.

 

  1. Quais são as principais semelhanças e diferenças, em termos de competitividade, entre as indústrias automotivas portuguesa e espanhola?

As principais semelhanças estão nas oportunidades e as principais diferenças centram-se na estrutura da indústria automóvel. Estruturalmente, Espanha conseguiu criar um fabricante (OEM) de origem nacional, a SEAT (mais tarde integrada no grupo VW) e garantir uma autonomia importante das unidades de montagem dos diferentes construtores instaladas no país, que permitiu criar uma indústria robusta e com competências em toda a cadeia de valor da indústria automóvel. Este facto faz toda a diferença no desenho da estrutura da indústria e na forma como compete internacionalmente.

É ao nível das oportunidades que poderemos encontrar pontos em comum, pois com a transformação que e indústria automóvel está a sofrer, abrem-se espaços para novos entrantes que integram verticalmente o seu negócio com a operação dos veículos. Esta é, também, uma oportunidade para desenvolver uma indústria ibérica de nova geração, a partir de cadeias de valor locais (ibéricas), apostando também na diversificação para novos modelos de negócio, apoiando as empresas para evoluírem como integradores capacitados para operar serviços de mobilidade de nova geração.

 

  1. Como você vê, do ponto de vista da mobilidade avançada e ampliada, o futuro das comunicações entre o norte de Portugal e a Galiza?

Consideramos que a mobilidade entre as duas regiões, no futuro, será mais integrada e vai responder às necessidades das populações residentes, descentralizando a dependência dos centros urbanos de maiores dimensões. Com o advento de novas tecnologias, como o 5G, e com o aumento da literacia tecnológica, as tendências de digitalização da sociedade vão ser incorporadas nas comunicações e na mobilidade de ambas as regiões. Esta realidade terá como consequência um forte contributo para a descarbonização dos espaços urbanos sem descurar a sustentabilidade económica das duas regiões.

 

  1. Quais são os principais desenvolvimentos, em termos de design e inovação, no setor automotivo em Portugal? (somente para CEiiA)

Ao nível do veículo, os principais avanços têm a ver com a evolução das baterias, dos materiais e das arquiteturas dos veículos, bem como da conetividade e da automação. Estas são algumas das inovações por parte de construtores com fábricas em Portugal, e pelas empresas fornecedoras, principalmente os fornecedores de primeiro nível.

No caso do nosso projeto BE do CEiiA, que envolve várias empresas nacionais e universidades, assenta no desenvolvimento em cinco principais áreas de inovação a partir das competências existentes do tecido industrial nacional, em torno de um protótipo e de uma estratégia de industrialização de nova geração. As áreas de inovação passam pelos interiores interativos e funcionais; pelas estruturas configuráveis; pelas funções autónomas; pelos sistemas de carrega- mento de nova geração (caso do carregamento por indução) e pelos sistemas de conetividade.

Ao nível da infraestrutura, existem novos desenvolvimentos em Portugal no modelo de mobilidade elétrica que incorpora a sustentabilidade como um dos grandes drivers desta nova fase de evolução. Depois de ter sido um país pioneiro em 2009, ao ser o primeiro a ter uma rede de mobilidade elétrica a nível nacional, MOBI.E, com algumas experiências de roaming com Vigo. Para além disso, o hidrogénio é hoje também uma aposta estratégica em Portugal, da geração até aos novos modelos de uso.

Na área dos serviços de mobilidade, destacam-se vários projetos inovadores, nomeadamente na cidade de Matosinhos e Cascais, focados na integração dos serviços de mobilidade, para diminuir custos, tempos e aumentar a sustentabilidade na forma como nos movemos nas cidades.

 

  1. CEiiA nasceu em 1999, o que mudou nos últimos vinte anos por parte da entidade que você representa? E no setor, tanto em seu país como na Euroregião Galiza-Norte de Portugal?

Em 1999 começámos por construir um fórum que juntou diferentes players nacionais e internacionais, da política pública, do sistema financeiro, da ciência, tecnologia e inovação e da indústria, em torno de uma estratégia de desenvolvimento da indústria automóvel e da sua evolução para a indústria da mobilidade, com vista à criação do Centro de Engenharia do CEiiA.

O Centro de Engenharia do CEiiA foi então criado em 2006 com a missão de atrair grandes projetos estruturantes para Portugal que envolvem o desenvolvimento e a integração de novos produtos e serviços a partir de Portugal.

Nos últimos anos, assistimos a uma evolução na forma como as pessoas se deslocam nas cidades que se deveu ao facto da mobilidade começar a ser pensada de forma integrada entre a mobilidade física, a mobilidade de informação em torno de plataformas zero emissões, dando origem à mobilidade elétrica e à mobilidade como um serviço. São disso exemplos várias aplicações que começaram a surgir, como é o caso da mobilidade on-demand (ex: Uber), o caso da mobilidade como serviço, com a integração de todos os serviços de mobilidade numa única plataforma na cidade em Cascais em Portugal, e, mais recentemente, a sustentabilidade como um serviço.